Caminhabilidade com os pés no chão
- Leandro Matias
- Feb 5
- 2 min read

As cidades falam. Não em discursos formais, mas em suas ruas, praças e esquinas. Algumas sussurram convites ao encontro, à pausa e ao olhar atento. Outras, apressadas, gritam ordens de passagem, como se o tempo fosse sempre curto demais para a vida. Urbanistas renomados como Jeff Speck e Jan Gehl, autores de “Cidade Caminhável” e “Cidade para Pessoas", respectivamente, entenderam esse diálogo e o traduziram em conceitos que parecem óbvios: boas cidades são aquelas que fazem as pessoas quererem estar nelas, não apenas atravessá-las. Mas o óbvio, na prática, nem sempre se impõe.
O crescimento urbano tem um ritmo próprio, nem sempre planejado, nem sempre racional. Enquanto algumas cidades aprendem a adensar com inteligência, otimizando espaços já servidos de infraestrutura, outras se expandem para além de seus limites funcionais, criando uma rede frágil de ocupações desconectadas. Nessas áreas, caminhar não é escolha, é desafio. O sol inclemente, a ausência de sombra, a falta de calçadas adequadas e a insegurança tornam o simples ato de percorrer uma rua uma tarefa árdua. E ainda assim, há quem caminhe - em sua maioria por falta de opção melhor.
Em “Cidade Caminhável”, Speck nos lembra que para haver caminhabilidade, precisamos de espaços úteis, seguros, confortáveis e interessantes. Mas para isso, eles precisam, primeiro, entender suas próprias vocações. Adensar bairros já consolidados, criar espaços públicos de qualidade e integrar diferentes funções no mesmo território são soluções que tornam a caminhabilidade natural, não um esforço.
Mas a questão não é apenas onde as cidades crescem, e sim como. Nem toda expansão é progresso, assim como nem todo adensamento é sinônimo de qualidade. O equilíbrio entre infraestrutura e ocupação urbana deveria ser o primeiro critério para definir para onde e como uma cidade se expande. Caminhabilidade, afinal, não é só uma questão de desenho urbano; é uma escolha sobre o tipo de vida que queremos viver nas cidades que habitamos. E a cidade que construímos revela muito sobre o que valorizamos. Se priorizamos ruas onde se anda com prazer, onde a sombra das árvores refresca e o encontro é parte do trajeto, estamos dizendo algo sobre a forma como enxergamos o tempo, a convivência e até o futuro. Se, por outro lado, seguimos criando espaços onde o caminhar é um fardo, um risco ou um mero deslocamento entre um ponto e outro, estamos, sem perceber, desenhando cidades que afastam em vez de aproximar. No fim, a pergunta que fica não é apenas para onde queremos ir, mas se estamos tornando o próprio caminho algo que valha a pena percorrer.
Leandro Matias, CEO It Homes
Empresário e consultor, Leandro é administrador de empresas, bacharel em direito, especialista em marketing, técnico em transações imobiliárias e pós-graduando em desenvolvimento urbano estratégico pelo Instituto Cidades Responsivas. Há 18 anos trabalha com comunicação, customer experience e inteligência de mercado para solucionar desafios em percepção de marcas, negócios e produtos imobiliários.
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